domingo, 16 de março de 2014

Psicologia nos Filmes


Laranja Mecânica


Resumo:
  
O filme de Stanley Kubrick, baseado no livro “Laranja Mecânica” de Anthony Burgess, se passa numa Inglaterra totalmente destruída e dominada por gangues, este filme nos mostra a história de um jovem, chamado Alexander De Large. Cujos gostos variam entre música clássica e violência. Ele é líder de uma gang de arruaceiros, do qual abusa dos demais, e tem disputas com outras gangues de jovens como eles. Estes jovens falam com gírias próprias criadas por eles. Frequenta um bar chamado “Moloko” onde substâncias alucinógenas são ingeridas misturadas com leite, essa substância que os deixam ainda mais violentos, e onde passam sempre para se preparar para suas noites de “ultra-violência”, sem motivo aparente. O primeiro ato que assistimos é ele e seu grupo de “droogs” (amigos) espancarem um mendigo alcoolizado que lhes pediu auxílio, ele narra o filme desde o início e diz que simplesmente odeia bêbados, mas principalmente os velhos. Logos após, encontram uma gang rival prestes a estuprar uma mulher, sua chegada impede que eles pratiquem o estupro, entram em confronto, o grupo de De Large venceu, mas mesmo assim ainda continuam batendo nos corpos estendidos, param por causa da chegada da polícia. Eles saem em velocidade pelas estradas, ameaçando todo e qualquer veículo à frente. Deparam-se com uma residência, enganam os donos (um casal, onde o homem é escritor) fingindo estar precisando de ajuda para que eles abram tarde da noite. Invadem a casa, espancam o dono, destroem parte da casa onde o escritor trabalhava e havia seus livros e máquina de escrever. Estupram sua esposa, enquanto praticam tudo isso, Alexander canta “Dançando na Chuva” de uma forma sarcástica, eles mantêm seus rostos cobertos com máscaras para não serem identificados. Fazem questão de que o marido veja todo o estupro de sua esposa. Depois eles voltam para o bar onde De Large observa um grupo de pessoas da TV se divertindo e também provando do leite cheio de drogas, de repente uma mulher do grupo começa a cantar um trecho da Nona Sinfonia de Beethoven. Um de seus comparsas zomba da música e Alexander revida imediatamente com um golpe da bengala que ele usa, na barriga de um de seus irmãos. Começa o início de uma discussão onde o agredido diz que não existe sentido em Alexander bater nele, mas como líder ele propõe uma luta para resolver a situação, mas o outro desiste por medo. Cada um volta para sua casa, Alexander deposita tudo o que conseguiu com o roubo da casa em uma gaveta em que já existem muitos outros produtos de roubo. Ele possui uma cobra de estimação no quarto. Coloca a Nona Sinfonia de Beethoven sua preferida, para ouvir enquanto devaneia sobre muitas outras cenas de violência. 
  Ele não vai à aula no dia seguinte, percebe-se que ele mente para os pais dizendo que trabalha durante a noite. Recebe a visita de um Sr. Deltoid, um tipo de consultor pós-correcional da escola de De Large, que o adverte depois de ver nos canais de notícia informações do conflito de gangues, onde o nome dele e de seus amigos foi mencionado, que ao invés de ir para escola correcional poderá acabar na cadeia. Numa das cenas seguintes ele seduz duas adolescente e transa com elas (numa técnica de aceleração do vídeo dado pelo diretor). Começa um indício de que seus colegas de gangue não estão satisfeitos com a liderança de Alexander e preferiam que não fizesse mais parte do grupo. Ele novamente impõe sua liderança com mais violência, chegando a cortar a mão de um da gangue. Após isso todos aparentemente aceitam que devem ser liderados por ele. Mas durante um assalto à casa de uma senhora, os “droogs” (amigos) o traem e Alexander é capturado. Na saída da casa leva uma garrafada de leite no rosto, de um de seus “irmãos” e fica temporariamente cego enquanto a polícia está vindo, chamada pela proprietária da casa que desconfiou quando usaram o mesmo método usado para entrar na casa do escritor, que ela teve conhecimento pelos jornais. Depois de preso descobre que a vítima do roubo morreu. Alexander é condenado a 14 anos de prisão. Na cadeia ele se aproxima do capelão, para se desviar das investidas homossexuais dos outros presos e da violência dos próprios guardas da prisão. Passa dois anos encarcerado. Fica sabendo pelos burburinhos dos guardas e pelo padre, de um tratamento em fase experimental que o faria ser liberto o mais rápido possível, o tratamento Ludovico. Candidata-se a este tratamento quando são visitados pelo novo Ministro do Interior. 
  Sai da cadeia e é encaminhado para o centro médico, onde é submetido ao tratamento Ludovico, uma terapia experimental de aversão, desenvolvida pelo governo para deter os crimes na sociedade. Este tratamento consiste em assistir formas extremas de violência e abusos sexuais sob o efeito de uma droga injetada no paciente para que sinta dores e enjoos. Alexander é colocado para assistir um filme com cenas fortes do período Nazista com trilha sonora de Ludwig van Beethoven na sua 9° Sinfonia que ele tanto gosta, ele é incapaz de parar de assistir, pois seus olhos estão presos por um par de ganchos, para que associe as ações violentas com a sensação física desagradável causada pela droga. Após o término do tratamento ele é considerado curado, “incapaz de cometer novos crimes”, então ele é liberado da prisão. O tratamento o torna incapaz de qualquer ato de violência ou comportamento sexual. Então ele volta para casa, mas para sua surpresa a encontra ocupada, seus pais alugaram seu quarto para um moço, sua cobra de estimação morreu, Alex, então desanimado saí de casa. Sem a capacidade de se defender e sem ter para onde ir, Alexander sente-se deprimido, e perambula pela cidade de Londres. Ele encontra um idoso morador de rua que vem pedir dinheiro para ele, o idoso o reconhece como aquele que antes o havia espancado, e chama seus amigos também da rua que revidam também o espancando. Ele então é socorrido pela polícia, policiais estes que são dois de seus antigos amigos de noites de “ultra-violência”, que o levam para um lugar afastado e também o espancam, e depois quase o matam afogado. Alexander vaga pelas estradas até chegar à casa do escritor cuja esposa havia estuprado, totalmente atordoado e inicialmente sem perceber que já esteve lá, caí em sua porta. Ele é acolhido pelo escritor que agora mora com um jovem grande e alto chamado Julian que parece ser um tipo de guarda-costas.
  O escritor não o reconhece e deixa-o entrar, ao recolhê-lo, em um momento, Alexander tomando banho em seu banheiro, ele começa a cantar “Dançando na Chuva” e o dono da casa escuta (durante um telefonema que ele estava fazendo, onde se mostra contra as novas medidas do governo de diminuição da violência e explica que o rapaz que bateu na sua porta é a prova viva de que esse sistema não funciona) e percebe imediatamente que aquele rapaz que ele acolheu foi o mesmo que violentou e posteriormente causou a morte de sua esposa, além de sua paraplegia. Vê ali uma forma de se vingar, droga-o com uma bebida forte e tenta fazer com que ele se suicide ouvindo a Nona Sinfonia de Beethoven, que Alexander o relata que por causa do tratamento não suporta mais ouvir essa música que antes gostava, mas que agora lhe causa intenso desconforto. Ouvindo a 9° de Beethoven Alexander se joga da janela do quarto onde foi trancado, mas não morre. Ele então é socorrido e levado ao hospital, onde aparentemente passa por uma cirurgia no cérebro. O Ministro de Interior que havia antes levado Alexander para o tratamento Ludovico o visita em seu leito, desculpando-se pelos efeitos do tratamento, dizendo que só seguia as orientações de sua equipe e não fazia ideia de que era tão nocivo. O governo então oferece a Alexander um trabalho muito bem remunerado, se ele aceitar apoiar o partido. Cuja imagem ficou muito danificada pela tentativa de Alexander de se matar, e pelo tratamento pelo qual ele foi submetido. Ele aceita a proposta, e se sente curado voltando a ser o que era antes, mas agora novamente só recebera consequências positivas por seu comportamento imoral e antiético.



Análise: A partir do Behaviorismo


 Alexander passa durante o filme por condicionamentos Operante e Clássico, operante quando está solto na cidade que seria o ambiente em que ele opera e é operado, a sequência R–C, onde R seria seu comportamento, ou seja, sentir prazer na violência e formar uma gangue , tomar drogas para aumentar sua agressividade e assim sair cometendo atrocidades a muitas pessoas. E C seria as consequências que o ambiente dava a ele, inicialmente, que eram reforçadoras e aumentavam seu comportamento, a sensação de prazer que tinha nos atos criminosos, as coisas materiais que roubava e apenas os alertas sobre o que poderia lhe acontecer mas nada acontecia, eram suas consequências positivas, assim ele continuava se comportando da mesma forma.
 Quando ele é preso dentro da cadeia também existe um condicionamento operante sendo imposto aos presos, literalmente o meio opera sobre eles e estes não possuem vontade própria, existem consequências reforçadoras para quem se adequa ao ambiente e se “reeduca”, pode ter a pena diminuída ou até ser reinserido na sociedade. Deixar de estar preso seria um reforço Negativo, ou seja, a cessação de algo que desagrada o organismo. E as consequências para quem não obedece as regras do ambiente são punições. Durante o tratamento Ludovico Alexander é submetido ao condicionamento Clássico, quando é preso a uma cadeira sob o efeito de uma droga injetada em seu organismo, que o faz sentir dores físicas e anciãs de vômito, enquanto filmes de violência são passados e ele é obrigado a vê-los, porque seus olhos estão presos com grampos para que não se fechem. Nesta situação ele não pode se movimentar no ambiente, e seus comportamentos são involuntários, o contrário do operante em que estes são voluntários. No Clássico existe a sequências S-R, S seria o estímulo, que no tratamento eram os filmes passados e a 9° Sinfonia de Beethoven, e R a consequência, que em De Large nessa parte não eram naturais, mas sim a que os médicos queriam que ele tivesse, causado pela droga que o fazia sentir dores e enjoos durante as sessões de filmes que anteriormente lhe causariam prazer e divertimento, e que agora eram causa de grandes desconfortos. No clássico existem reações causadas por um comportamento respondente. Seria o pareamento de dois estímulos, um inato e involuntário (Alexander assistindo os vídeos e se sentindo mal) e o outro neutro (enquanto tudo acontece à música de Beethoven toca), assim sendo causa-se uma relação do reflexo com o estímulo neutro. Na presença do estímulo neutro o reflexo vem à tona, quando a música toca, De Large tem reações fisiológicas muito desagradáveis e só consegue pensar em acabar com toda essa dor.
 Depois do tratamento e supostamente curado ele volta para a sociedade. Mas nessa parte percebe-se que o tratamento Ludovico o deixou totalmente incapaz de se defender ou ter qualquer comportamento sexual, porque em qualquer situação que envolva confronto ele imediatamente se sentia muito mal fisicamente. Nesse ambiente em que ele agora pode se movimentar, ele passa novamente pelo condicionamento operante, mas agora ele está recebendo punições por seus comportamentos anteriores. O comportamento do organismo ou seu R é totalmente inofensivo, mesmo que não seja por vontade própria, e as consequências que o meio está dando, ou o C são totalmente punitivas. Essas punições acarretam efeitos colaterais em um organismo que foi condicionado para não reagir de forma violenta em hipótese alguma. Este efeito colateral não controlado é a tentativa de suicídio de Alexander.
 O filme todo se trata de uma crítica à teoria behaviorista, logo o título é uma alusão a isso, “Clockwork Orange” significa laranja com mecanismo de relógio, que dá uma visão de algo programável e robótico como um relógio. “Orange” tem semelhança no inglês com a palavra “orang-utan” um macaco, um animal que pode ser domesticado. A proposta de que estamos todos tendo nossos comportamentos controlados de alguma forma, e não fazemos realmente escolhas, é a intenção do filme. O diretor nos mostra em quase todas as cenas uma violência subliminar a que esse ambiente, a realidade que o Alexander vive, está submetido. Aparentemente todos são livres para tomar suas próprias decisões, mas qualquer um que não siga a regra do grupo é punido de forma violenta e excluído do convívio social. O comportamento emocional, tanto de agressividade como qualquer outro, é natural do ser humano e se for totalmente retirado teremos indivíduos robóticos. Nos jovens principalmente, é natural ver essas emoções exageradas se manifestando. A ideia do behaviorismo de que podemos controlar comportamentos, retira a questão do livre arbítrio dos indivíduos, tanto no clássico como no operante o sujeito não tem processos cognitivos agindo. Mesmo no operante cria-se uma relação contingente dentro do cérebro, “se eu fizer isso, recebo isso”, então continuarei me comportando dessa forma. No final o meio ambiente de De Large se mostra pouco preocupado com seu comportamento arbitrário, com sua falta de moralidade interna, com o que seria certo ou errado, o que tem relevância é o que os meios de comunicação divulgam que também são uma forma de manipulação, e qual o governo que está sendo apoiado no momento. Ou seja, quem está no comando no momento. A moralidade e ética do seu meio e do governo é totalmente hipócrita quando se fala em defender suas questões pessoais. Contando que todos continuem andando na linha como na cena dos presos dentro da cadeia seguindo o círculo no chão, tudo fica bem.